Os comerciais mais cretinos do mundo
Até meados da década de 90 era fácil topar com um comercial cretino na TV brasileira. Bastava assistir um comercial de cigarro.
Sim, crianças, houve época nesse país em que os fabricantes de cigarro anunciavam seus produtos em horário nobre. No intervalo da novela das oito, por exemplo, entre um sorriso artificial de Tarcísio Meira e um ataque histérico de uma Helena qualquer, você podia assistir aqueles caubóis cancerosos do Marlboro, montados em seus cavalos cancerosos, perseguindo vacas cancerosas e bebendo café canceroso. Ou então você podia assistir um ator famoso qualquer dizendo que você e ele tinham "alguma coisa em comum". Ou então um ex-jogador qualquer dizendo que gostava de "levar vantagem em tudo, cerrrto?"
A cretinice fumarenta acabou em janeiro de 2001, quando os comerciais de cigarro foram banidos da TV brasileira, esperemos que para sempre. Mas isso não quer dizer que a cretinice publicitária acabou. De fato, com o advento da TV por assinatura e com o aumento da concorrência, ela só se intensificou.
Não estou falando daqueles famosos "infomerciais", que não passam de arremedos de lavagem cerebral tentando nos empurrar furadeiras revolucionárias, equipamentos para ginástica, roupas que emagrecem, chás que emagrecem, comidas que emagrecem e máquinas fotográficas que emagrecem. Estou falando apenas de comerciais comuns, embora cretinos.
Antes de prosseguir, contudo, é conveniente observar que nesses tempos politicamente corretos é arriscado proncunciar a palavra "cretino", pois, de acordo com nosso velho amigo Aurélio, ela significa:
1. Patol. Que sofre de cretinismo.
2. P. ext. Lorpa, pacóvio, idiota.
Assim, em respeito aos cinco leitores desse blog, nenhum dos quais é um lorpa, vou passar a usar o termo "pacóvio" em substituição a "cretino". Os pacóvios não entenderão nada, é claro, mas nessa altura eles já devem ter parado de ler minha pequena "preleção".
Voltando ao assunto, minhas pesquisas televisivas indicam que a pacovice migrou dos comerciais de cigarro para os comerciais de creme dental. Talvez isso esteja relacionado à "lei de conservação da pacovice", que decorre do fato que os publicitários que trabalhavam em comerciais de cigarro tiveram que migrar para outras áreas, levando junto sua pacovice.
Poucas coisas são mais irritantes que assistir um comercial que tenta vender uma mistura pastosa de sabão, flúor, pó abrasivo e hortelã (ou menta americana, ou pimenta mexicana, ou qualquer coisa parecida). Um comercial de creme dental bem feito já é ruim, mas um comercial de creme dental pacóvio é mais irritante que Chitãozinho e Xororó tentando cantar uma ópera de Verdi, acompanhados de uma araponga no cio e de um porco sendo estripado.
Em um deles, direcionado a crianças pacóvias e embalado por uma musiquinha muito da lorpa, os publicitários tentam nos convencer que "com um belo sorriso, você pode chegar a presidente". Tudo bem, recomenda-se que presidentes de empresa tenham o sorriso em dia, mas só isso não basta, né?
Mas isso não é nada. Em uma série recorrente de comerciais, um ator amador, conversando com uma pessoa fora da cena, comenta sobre seus problemas dentais. Presume-se que, em meio a uma conversa qualquer, as pessoas finalmente chegam naquele ponto em que começam a falar de seus problemas com mau hálito, placas bacterianas, tártaro, dentaduras, gengivas inchadas, fístulas purulentas e dentes podres. E um ator em início de carreira, incapaz de conferir a ênfase correta a uma curta frase, é capaz de conferir a dose exata de autoridade necessária para que um consumidor compre o creme dental XYZ, não é?
E isso ainda não é o pior, pois esses comerciais simplíssimos, rodados em uma única sala de estar, com uma única câmera e um único ator, são pacóvios a ponto de conter erros de continuidade! Em um deles, por exemplo, o cabelo da atriz oscila da frente dos ombros para trás, e vice-versa, enquanto a câmera faz os cortes. Fantástico!
Para nosso terror, nunca é demais lembrar Murphy, que dizia: "sorria hoje, pois amanhã será pior". De fato, os comerciais pacóvios de dentifrício não são nada perto da verdadeira lorpice profissional que invadirá as televisões brasileiras a partir de 15 de agosto próximo: o horário eleitoral gratuito. Senhor, tende piedade de nós!
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