sábado, novembro 26, 2011

Diretor da Aneel lamenta falta de hidrelétricas no leilão A-5

Edvaldo Santana, diretor da ANEEL, comenta: "Não sei se vai se sustentar por muito tempo essa expansão com eólica, eólica, eólica". Mais detalhes em http://bit.ly/tHjdQY.

Uma opinião embasada que mostra o outro lado da gota d'água.

segunda-feira, novembro 21, 2011

Belo Monte e outras questões complicadas

Na semana que passou o movimento Gota D'água publicou um vídeo, encenado por atores conhecidos, criticando a construção da UHE Belo Monte, a entrar em operação em 2015, no Rio Xingu (Pará). A capacidade instalada da usina, 11.233 MW, fará dela a terceira maior usina hidrelétrica do mundo, quando classificadas pela capacidade. Contudo, restrições ambientais farão com que a usina funcione a fio d'água, com capacidade reduzida de armazenamento, gerando 4.571 MW médios, o que corresponde a um fator de capacidade de 40,7%. Para fins de comparação, o fator de capacidade médio das hidrelétricas brasileiras é 55%. A média mundial é menor do que isso, talvez chegando a 45%. Isso ocorre porque o Brasil é um dos poucos países de fato hidrotérmicos, que baseia mais de 90% de sua produção energética em usinas hidrelétricas e usa as termelétricas como complementação. Outros países detêm pouca capacidade hidrelétrica, usando-a em períodos críticos e optando pelas termelétricas ou nucleares como fonte energética principal. Por exemplo, a famosa Barragem Hoover, de 2.080 MW, localizada no Rio Colorado, na fronteira entre os estados norte-americanos de Arizona e Nevada, tem fator de capacidade de 23%.

Um dos argumentos dos ambientalistas que se opõem à construção de Belo Monte é o tamanho do reservatório da usina, que terá 516 km². Tal número, que resultou da revisão do projeto (a área anterior era de 1.225 km²), equivale à área de um quadrado de 22,7 km de lado e deve ser colocado em perspectiva. Primeiramente, a área conjunta dos reservatórios das duas usinas do Complexo Rio Madeira, por exemplo, já em construção em Rondônia, é semelhante à de Belo Monte: o reservatório da UHE Jirau tem 258 km² e o reservatório da UHE Santo Antônio tem 271 km². Juntos, ambos somam 529 km². Por outro lado, a área do reservatório da UHE Tucuruí, em operação no Pará desde 1984, é de impressionantes 2.850 km². Em outras palavras, as usinas amazônicas mais recentes fazem uso mais eficiente de seus reservatórios, pelo menos em termos de sustentabilidade ecológica, em comparação à quase balzaquiana Tucuruí. Este fato fica evidente a partir da análise da densidade de energia, conforme a tabela abaixo, que mostra os dados de algumas hidrelétricas amazônicas (clique sobre a tabela para ampliá-la).


Em segundo lugar, podemos comparar o reservatório de Belo Monte ao desmatamento na região amazônica. Uma das várias estatísticas disponíveis indica um desmatamento mensal de 110 km², somente no estado do Pará [3]. Em um mundo ideal, nem desmatamentos nem alagamentos existiriam e ainda haveria comida e energia para todos. Todavia, ao construirmos em nossas mentes um mundo ideal e depois compará-lo aos fatos reais, incorremos em um argumento conhecido como falácia do Nirvana, que denota nossa tendência de buscar soluções ideais para problemas reais. No mundo real, contudo, devemos buscar alternativas concretas para o ideal. E, se for possível escolher, é certamente muito melhor construir usinas hidrelétricas, que operarão por 30 anos ou mais e ajudarão no crescimento do Brasil, do que queimar 1.320 km² anuais em florestas (duas vezes e meia Belo Monte) e substituí-las pelas pobres pastagens que podem crescer no solo amazônico ou, pior ainda, substituí-las por uma grande desolação. Ainda assim, caso decidamos não construir Belo Monte (o que será muito difícil, pois o leilão já foi realizado e efetivado), algum substituto real, não utópico, não nirvânico, deverá ser encontrado.

Uma opção interessante são as usinas eólicas, que estão se tornando cada vez mais competitivas. Entretanto, além de terem baixos fatores de capacidade (40% a 45%, no máximo), é bem conhecido que o vento não pode ser armazenado. Por causa disso estima-se que a capacidade das eólicas não deva ultrapassar 20% da capacidade instalada total de um sistema interligado. No nosso caso, esse limite corresponderia atualmente a 23.250MW, pouco mais de duas vezes Belo Monte (que, coincidentemente, terá o fator de capacidade de uma eólica de fator elevado). Considerando que temos 1.260 MW de capacidade eólica em operação, que outros 4.113 MW foram outorgados entre 1998 e 2010 e que 6.052 MW foram habilitados no leilão A-3/2011, talvez não demore muito para atingirmos tal limite. Depois disso, contaremos apenas com a expansão eólica na margem de crescimento.

Outra opção é a construção de usinas solares, mas estas são ainda muito caras, a ponto de a Espanha já estar optando por uma pausa nos investimentos solares [4]. Temos também as termelétricas a gás natural, com 11.424 MW em operação, 1.818 MW outorgados, mas apenas 13,16 MW em construção [1]. Pode parecer estranho, mas temos mais capacidade termelétrica a óleo combustível, óleo diesel e carvão mineral em construção (351 MW, 1.700 MW e 1.440 MW, respectivamente) do que a gás natural [1], o combustível menos poluente e mais fácil de transportar dentre todos . Mesmo assim, os movimentos ambientalistas contra usinas a carvão, a óleo e a diesel são poucos e pouquíssimo representativos quando comparados aos movimentos contra Belo Monte.

As usinas nucleares são uma opção interessante, mas tornaram-se mais caras e problemáticas depois de Fukushima e certamente enfrentarão oposição das mesmas ONGs que se opõem a Belo Monte e de muitas mais. E, finalmente, temos a opção da eficiência energética, que certamente deve ser buscada por uma simples questão de redução de custos e de desperdícios. Contudo, esperar que um país detentor de um discretíssimo consumo anual de 2,14 MWh per capita, como é o caso do Brasil, que ocupa o 64° lugar nesse requisito, encontre sua solução energética na busca por consumos mais eficientes é, mais uma vez, parte de uma utopia. A solução real será, como sempre, uma composição de todas as soluções disponíveis, inclusive das hidrelétricas de todos os portes. E deixemos a questão do desmatamento para algum especialista na área, talvez algum ator famoso.

[1] ANEEL. Banco de Informações de Geração - BIG. Disponível em: http://bit.ly/vJO0L9.
[2] ANEEL. Perguntas e respostas sobre Belo Monte. Disponível em: http://bit.ly/rBuysl.
[3] EXAME.COM. Pará lidera desmatamento na Amazônia, 1 de ago. 2010. Disponível em: http://bit.ly/sTe9EL.
[4] JORNAL DA ENERGIA. Setor elétrico espanhol pede pausa nos investimentos em energia solar, 18 de nov. 2011. Disponível em: http://bit.ly/v0VWbo.

segunda-feira, novembro 07, 2011

A questão do vencimento das concessões do Setor Elétrico

Na última quinta-feira, 3 de novembro, o ministro Edison Lobão, do Ministério de Minas e Energia (MME), teria informado aos presidentes de dez associações setoriais que a presidente Dilma pretende apresentar sua posição sobre a questão do vencimento das concessões do Setor Elétrico em um prazo de 30 dias. Tal decisão é importante para que seja tomado o próximo passo, que pode ser a prorrogação das concessões, a relicitação das mesmas ou até mesmo uma "solução híbrida" sugerida por alguns (relicitação em alguns casos, prorrogação em outros). Contudo, na data de hoje o MME publicou em seu site uma nota negando a informação e afirmando que não há posição definida sobre o assunto.

Essa questão vem sendo intensamente debatida há algum tempo e atinge maciçamente o Setor Elétrico, da geração à distribuição, passando pela transmissão. A maior parte das concessões problemáticas expira em 2015. Neste ano vencerão as concessões de geração de 13 empresas brasileiras, totalizando 18% da garantia física do país, quando medida em MW médios. Da mesma forma, vencerão as concessões de transmissão de 9 empresas de transmissão, as quais correspondem a 80% dos 95 mil km de linhas de transmissão do sistema nacional. Finalmente, 38 distribuidoras terão suas concessões expiradas, correspondendo a 35% do mercado regulado.

Do ponto de vista estritamente legal, o problema já estaria resolvido desde 1988, pois a Constituição da República prevê que, ao final de uma concessão, esta deve ser relicitada. No caso atual, todavia, sem contar os problemas decorrentes da organização de mega leilões de tantas concessões (aos quais o governo já deve estar acostumado, por causa dos constantes leilões de contratação de energia no Ambiente Regulado), haveria, por um lado, a dúvida sobre a existência ou não de agentes interessados na aquisição das concessões, particularmente neste período problemático para a economia internacional. Por outro lado, haveria também a necessidade de se levantar recursos para a compensação dos ativos ainda não amortizados. Novamente, a situação econômica atual dificultaria tal levantamento de recursos.

Por causa deste e de outros problemas, tudo indica que a presidente Dilma se manifestará favorável à prorrogação das concessões, não à relicitação. De acordo com uma fonte próxima à presidente, ela não gostaria de entrar para a história como a presidente que "acabou de vender o setor elétrico"[1]. Segundo Dilma, a relicitação teria ares das privatizações realizadas durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, as quais foram severamente criticadas pelo PT na época.

A possível posição da presidente Dilma é respaldada pelo relatório de um grupo de trabalho criado para tratar o assunto, que mostra que uma das vantagens da prorrogação seria a redução de preços para o consumidor. Tal redução ocorreria porque a prorrogação seria do tipo onerosa, com os contratos atuais prorrogados, mas com preços reduzidos, pois muitos dos investimentos já foram amortizados. Contudo, a redução de preços também poderia ocorrer com a relicitação das concessões, pois os vencedores das licitações poderiam oferecer preços mais baixos do que aqueles do início das concessões, mesmo considerando todas as amortizações desde então.

Uma pergunta que inevitavelmente surge é: por que a decisão não foi tomada antes? Afinal, este problema poderia ter sido resolvido ainda no governo do presidente Lula, pois é conhecido há muito tempo. Uma possível resposta é que o governo teria optado também há muito tempo pela prorrogação e tem passado o tempo em busca de argumentos técnicos que a justifiquem. De fato, a prorrogação necessitará de um parecer jurídico detalhado, o qual deverá ficar pronto em 2012, para que todas as providências possam ser tomadas.

Todavia, a mera prorrogação poderá não ser tão simples quanto possa parecer. Todo o modelo atual do Setor Elétrico, que tem se mostrado razoavelmente eficiente na atração de investidores, é baseado em concessões de 30 anos. Todas as concessões outorgadas desde a reforma do Setor Elétrico, no final dos anos 90, têm seguido esse modelo e os concessionários detentores das concessões atuais, que se encontram longe de vencer, poderão se sentir prejudicados, vindo a exigir prorrogações para eles também. Além disso, a prorrogação automática das concessões poderá causar insegurança jurídica, por causa da mudança na Constituição. A FIESP (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), por exemplo, havia anunciado em julho passado que iria entrar com uma representação no TCU (Tribunal de Contas da União) contra a prorrogação automática das concessões, por causa de tal insegurança jurídica [2].

Cabe também lembrar que não estamos falando aqui de concessões vencendo após somente 30 anos, pois as empresas com concessões a vencer em 2015 exploram o serviço em média há 56 anos. Uma vez modificado o dispositivo constitucional que atualmente prevê a relicitação das concessões, as mesmas seriam prorrogadas por mais 30 anos. Caso isso aconteça, o que nos garante que tais concessões não poderão ser periodicamente prorrogadas até o final dos tempos, transformando empresas prestadoras de serviços públicos em verdadeiros "usucapiões" do Setor Elétrico?

[1] EXAME.com. Dilma quer renovar concessões do setor elétrico, 17 de julho de 2011. http://bit.ly/ncZmYv
[2] FOLHA.com. Fiesp é contra renovação automática de concessões no setor elétrico, 12 de julho de 2011. http://bit.ly/sZUKtK