segunda-feira, abril 30, 2007

Ex-professor do CEFET-PR é presidente da Nokia do Brasil

Demorei um pouco para perceber que o sujeito que aparece na capa da revista Você S/A desse mês é Almir Narciso, ex-professor do curso de Engenharia Industrial Elétrica do CEFET-PR, hoje UTFPR. Pelo que me lembro, ele lecionava a disciplina de Tópicos de Eletrotécnica, em regime de 20 horas. Na época ele trabalhava também na Prosdócimo e permaneceu lá após a empresa ter sido comprada pela Electrolux, tendo chegado a uma posição de gerência. Algum tempo depois, Almir foi descoberto pela Nokia, que o contratou para um cargo executivo, e galgou sucessivas posições até chegar a presidente da subsidiária brasileira. Não sei se foi exatamente ao passar da Electrolux para a Nokia, mas em algum ponto ele teve que abandonar a carreira docente.

Embora este não seja o primeiro caso, é interessante saber que um ex-colega chegou a uma posição executiva tão importante, mas é decepcionante saber que sempre que isso acontece a carreira docente é a primeira a ir para o brejo. Não seria importante que as universidades brasileiras tivessem programas especiais para atrair professores com esse tipo de formação profissional? Contudo, o atual sistema de contratação e gestão de recursos humanos nas universidades públicas, com sua ênfase no mestrado e doutorado, não tem a mínima condição de atrair professores cuja formação profissional deu-se mais no mercado do que na academia.

E quem vai ensinar nossos alunos a fazerem as coisas que esse pessoal faz?

domingo, abril 29, 2007

Descoberto o primeiro planeta habitável fora do Sistema Solar

Cientistas da Organização Européia para a Pesquisa Astronômica no Hemisfério Austral (ESO) afirmam ter descoberto um planeta habitável fora do sistema solar, com temperaturas muito similares às da Terra [1]. O planeta, localizado no sistema de Gliese 581, distante 20,5 anos-luz do sistema solar, tem massa cinco vezes superior à da Terra e capacidade para manter água em estado líquido, pois apresenta temperaturas variando entre 0ºC e 40ºC.

O chato de se ter passado parte da adolescência lendo autores como Asimov, Clarke, Heinlein e Bradbury é que descobertas como essa não me surpreendem. A única surpresa é o fato de ter demorado tanto tempo para um “planeta terrestre” fosse descoberto fora do Sistema Solar.

De qualquer forma, agora ficou muito claro para todos que a probabilidade de se encontrar vida fora da Terra é grande. Talvez até vida inteligente. Não somos o auge da criação e nem o macaco escolhido por Deus para controlar o destino do Universo. Somos apenas um acidente evolutivo. Um acidente importante e glorioso, sem dúvida, mas nada mais do que um acidente.

domingo, abril 22, 2007

Newton C. A. da Costa, Cidadão Benemérito do Estado do Paraná

Foi realizada na última quarta-feira, 18 de abril, em Curitiba, a sessão solene de entrega do título de Cidadão Benemérito do Estado do Paraná ao professor Newton Carneiro Affonso da Costa [1].

Nascido em 1929, em Curitiba, Newton da Costa graduou-se em Engenharia Civil pela Universidade Federal do Paraná, em 1952, e em Matemática pela mesma universidade, em 1955. Em 1961, concluiu seu doutorado em Matemática.

No Brasil, Newton da Costa lecionou em diversas instituições, como na Universidade Federal do Paraná, Universidade de São Paulo, na Universidade Estadual de Campinas, na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e, atualmente, no Departamento de Filosofia da Faculdade de Filosofia da Universidade de São Paulo.

No exterior, foi professor visitante, conferencista e pesquisador em várias como, por exemplo, Universidade de Paris, Louvain, Varsóvia, Califórnia (Berkeley e Los Angeles), Stanford, Nacional da Austrália, Bueno Aires, Católica do Chile e Nacional Autônoma do México, bem como nas Academias de Ciências da Polônia, da Bulgária e da União Soviética.

O reconhecimento internacional de Newton da Costa veio a partir de 1974, com a publicação do artigo "On the theory of inconsistent formal systems", que o lançou como um dos fundadores da lógica paraconsistente.

Ao longo de mais de 40 anos de carreira, Newton da Costa publicou mais de 250 trabalhos, entre livros, artigos e notas, escritos em português, inglês, francês e espanhol. Dentre os vários prêmios recebidos pelo professor da Costa, encontram-se: Prêmio Moinho Santista em Ciências Exatas, em 1994; Prêmio Jabuti em Ciências Exatas, em 1995; Medalha da Ordem do Pinheiro do Governo do Estado do Paraná, por mérito científico, em 1996; Medalha do Mérito Científico "Nicolau Copérnico", outorgado pela Universidade de Torun, na Polônia em 1998; Medalha do Mérito Científico da Universidade Federal do Paraná e da Associação dos Ex-Alunos em 1998; Título de Cidadão Emérito do Paraná, conferido pela Assembléia Legislativa do Estado do Paraná, também por mérito científico, em 1999 [2].

A concessão do título de Cidadão Benemérito do Estado do Paraná vem certamente coroar a carreira deste importante cientista brasileiro, embora não seja totalmente inesperada. Em seu discurso durante a solenidade, o professor da Costa salientou que “o Brasil só sairá do Terceiro Mundo se, entre outras coisas, desenvolver a educação e a pesquisa em todos os setores”, inclusive em setores de pesquisa pura, como a Matemática e Filosofia. Vamos esperar que o governo atual preste muita atenção em tais palavras.

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[1] ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO PARANÁ, 17 abr. 2007. Disponível: http://www.alep.pr.gov.br/arquivos/geral_noticias_conteudo.php?notoid=7427&grupo=4

[2] COSTA, N. C. A. Currículo Lattes. Disponível: <http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.jsp?id=K4787165A0>

domingo, abril 15, 2007

Richard Feynman e o Prêmio Nobel

Pelo que me lembro, devo ter descoberto Richard Feynman (1918 – 1988) já no primeiro ano da faculdade de engenharia quando, ao perambular pelas estantes da biblioteca, encontrei os dois primeiros volumes das Feynman Lectures on Physics. Como tem acontecido com vários estudantes de física e engenharia quando descobrem essa obra, foi como se um mundo novo tivesse se descortinado. Nada daqueles textos chatos de física com exemplos banais, nada de planos inclinados, nada de revisão sobre sistemas de unidades. O texto de Feynman é tão original e direto que provoca um verdadeiro curto-circuito na mente do estudante.

Os três volumes das Feynman Lectures são o resultado de um curso introdutório sobre física, lecionado por Feynman no Instituto de Tecnologia da Califórnia (CalTech), uma única vez, entre 1961 e 1963. Posteriormente, entre 1964 e 1966, as Lectures foram editadas por Robert Leighton e Matthew Sands e publicadas em forma de livro. Em 1965, Feynman, já uma lenda da física aos 47 anos, dividiu o prêmio Nobel de Física com Julian Schwinger e Sin-Itiro Tomonaga, por seus trabalhos sobre eletrodinâmica quântica.

Durante muito tempo, as Lectures foram material raro no Brasil, somente encontradas em bibliotecas universitárias ou nas estantes de professores que viajaram ao exterior. Hoje, como ocorre com quase tudo, a obra pode ser comprada online e há um grupo de alunos e professores brasileiros trabalhando em uma tradução colaborativa para o português [1]. Há também rumores de que a Editora Livraria da Física [2] teria um projeto de tradução, mas não sei em que estágio o mesmo se encontra.

Devido às Lectures, em particular, e a suas aulas, em geral, Feynman adquiriu grande reputação como professor. No CalTech, a porta de sua sala estava sempre aberta aos estudantes, os quais, ele dizia, nunca faziam perder tempo, mas sim “ganhar tempo”. Contudo, com exceção dos estudantes e de algumas outras coisas, Feynman não tinha paciência com coisas que o faziam perder tempo. Uma dessas coisas era o prêmio Nobel.

Em seu livro autobiográfico [3], Feynman comenta alguma coisa sobre sua vida após o Nobel. Ele diz, por exemplo, que organizar uma palestra rotineira havia se tornado muito complicado, pois sempre apareciam pessoas de todos os tipos e ele não sabia como agradar a todos com seus assuntos usualmente áridos. Ele dizia também não entender a razão de honrarias como o Nobel. Em um trecho de uma entrevista especial, disponível em vídeo no YouTube [4] (ver abaixo), Feynman diz, em uma tradução livre:

“Eu não sei nada sobre o prêmio Nobel, não entendo do que se trata ou o quê vale o quê. Se as pessoas na Academia Sueca decidem que X, Y ou Z devem receber o prêmio Nobel, então que seja. Eu não terei nada a ver com o prêmio Nobel, é uma dor na... (risadas)...

Eu não gosto de honrarias. Sou reconhecido pelo trabalho que fiz e pelas pessoas que gostaram dele e sei que há outros físicos que usam meu trabalho. Não preciso nada mais além disso. Não penso que haja sentido algum em algo além disso. Não vejo que haja algo de importante em que alguém da Academia Sueca ache que esse trabalho é nobre o suficiente para receber o prêmio Nobel. Já recebi o prêmio, que é o prazer de descobrir as coisas, o mergulho na descoberta, a observação de que outras pessoas a usam. Essas são as coisas reais. Honrarias, para mim, não são reais. Não acredito nelas. Elas me aborrecem. Honrarias me aborrecem. Elas são uniformes, são divisas. Meu pai me criou desse jeito, não posso evitar, isso me magoa.

Quando eu estava no secundário, uma das primeiras honrarias que recebi foi ter me tornado membro do Arista, que era um grupo de meninos com boas notas. Todos queriam ser membros do Arista. Descobri que o que eles faziam em suas reuniões era sentar-se para discutir quem tinha valor suficiente para se unir àquele maravilhoso grupo que nós éramos. Esse tipo de coisa me aborrece psicologicamente por uma ou outra razão. Eu não entendo a mim mesmo. Honrarias, desde aquele dia, sempre me aborreceram. Tive problemas quando me tornei membro da Academia Nacional de Ciências. Declinei após algum tempo, porque era outra organização que passava a maior parte do tempo decidindo quem era ilustre o suficiente para se unir a ela. Isso incluía questões como: ‘nós físicos temos que nos unir, porque há um químico muito bom que está tentando entrar e não temos espaço suficiente...’. Qual o problema com os químicos? A coisa toda era podre, porque o propósito era principalmente decidir quem poderia receber as honrarias. OK? Não gosto de honrarias!”

Ao pensar dessa forma, Feynman caiu na “armadilha das honrarias”: ao aceitá-las, aceitamos também que somos dignos delas e não nos colocamos em uma posição muito humilde; ao recusá-las, ou ao desprezá-las, colocamo-nos acima delas e abandonamos de vez a humildade.

Apesar de tudo, Feynman aceitou o Nobel, pois, segundo ele, “recusá-lo teria sido mais complicado”(*). Em seu discurso no banquete ao rei da Suécia [5], em 10 de dezembro de 1965, ele finalizou com um misto de ironia e cortesia:

“Assim, vocês, povo da Suécia, com suas honrarias, seus trompetes e seu rei, perdoem-me, pois, finalmente entendo que tais coisas falam ao coração. Usadas por um povo sábio e pacífico, elas podem gerar bons sentimentos, até mesmo amor, entre os homens, até mesmo em terras muitas distantes das suas. Por esta lição, eu agradeço.“

A falta de humildade de Feynman não diminui sua dimensão intelectual, mas, vivendo em um país que nunca recebeu um Nobel, e que ainda está vivendo sua infância científica, tenho sérias dificuldades em entender a relutância dele, ou de qualquer outra pessoa, em relação ao prêmio. Afinal, não se trata de uma simples homenagem concedida por um clube de estudantes. Do meu ponto de vista, nem santos nacionais, nem anjos, nem o hexacampeonato mundial falariam mais fundo ao coração brasileiro do que um Nobel conquistado por algum de nossos conterrâneos. Com um pouco de sorte e muito trabalho, quem sabe algum dia um de nós poderá até mesmo desprezar esse prêmio.






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[1] Ver http://feyntrad.wikidot.com/start. (Não me perguntem sobre direitos autorais!).
[2] Ver http://www.livifusp.com.br/.
[3] FEYNMAN, R. Surely you’re joking Mr. Feynman!: adventures of a curious character, 1985.
[4] Ver http://www.youtube.com/watch?v=f61KMw5zVhg.
[5] Ver http://nobelprize.org/nobel_prizes/physics/laureates/1965/feynman-speech.html.
(*) Em toda a história do prêmio, iniciada em 1901, apenas duas pessoas o recusaram: Jean-Paul Sartre, que recusou o prêmio de literatura de 1964, sob a alegação de nunca aceitar honrarias oficiais, e o general vietnamita Le Duc Tho, que recusou o prêmio da paz de 1973, sob a alegação de que o Vietnã não estava em paz e, logo, a honraria, concedida a ele e a Henry Kissinger, não seria válida.

quinta-feira, abril 12, 2007

Kurt Vonnegut

Kurt Vonnegut faleceu ontem, aos 84 anos, em Nova Iorque. Há algumas semanas, Vonnegut havia sofrido uma queda em sua residência, tendo como conseqüência danos cerebrais irreversíveis.

Eu ouvi falar de Vonnegut há muito tempo, mas só fui ler um livro dele (“Matadouro 5”) em janeiro passado.

“So it goes”.

segunda-feira, abril 02, 2007

Discurso de formatura – UTFPR 2007

Meu primeiro discurso de formatura como paraninfo, lá pelos idos de 2002, foi razoavelmente bem recebido, mas se perdeu no último crash do meu computador. Para o segundo discurso, um ou dois semestres depois, preparei apenas algumas notas, as quais ainda tenho, e improvisei sobre elas. O resultado agradou a muitos alunos, mas alguns professores detestaram. Melhor não falar sobre isso. Nessa terceira oportunidade, para evitar que o texto se perca (risco que provavelmente só interessa a mim), resolvi publicá-lo aqui. A versão escrita é apenas um guia para a versão falada, a qual, para desespero de alguns, também teve certo grau de improviso.
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Ilustríssimo senhor diretor do campus Curitiba da Universidade Tecnológica Federal do Paraná, professor doutor Paulo Osmar Dias Barbosa, demais autoridades já mencionadas, queridos pais e familiares, prezadas senhoras, prezados senhores, caríssimos e novíssimos engenheiros e engenheiras recém-formados.

É uma satisfação e uma grande honra ser convidado como paraninfo da turma de vocês. É também uma grande surpresa, pois, na minha formatura, eu fui um dos candidatos a orador. Tive um voto, pois os meus colegas tinham muito medo que eu fosse falar bobagem.

Eles não tinham medo de uma bobagem do tipo que é só uma inverdade, como “a Terra é plana”, “os elefantes voam” ou “o Coxa é o melhor time do Paraná”.

Eles tinham medo de uma brincadeira ou piada que fica bem em determinada situação, mas pode causar constrangimento em outras. Eles tinham medo que eu pudesse ser deselegante.

Em defesa dos meus colegas, confesso que de vez em quando as probabilidades estão contra mim. Por exemplo, em palestra recente, eu tinha que falar sobre o Setor Elétrico Brasileiro, fazendo algumas comparações com países de menor consumo de energia. Comecei com o Equador, comentando sobre a fragilidade do sistema de transmissão deles, e finalizei com o Paraguai, comentando que teria sido mais fácil para o Brasil se, na época da construção de Itaipu, os paraguaios tivessem aceitado converter o sistema deles para 60 Hz.

Achando que tinha exagerado um pouco na parte do Paraguai, resolvi perguntar se havia algum paraguaio na sala. Uma menina levantou a mão. Eu perguntei se ela era mesmo paraguaia, pois ela falava português sem sotaque algum, e ela respondeu: “Não. A minha irmã é paraguaia. Eu sou equatoriana.”

Agora, me digam, qual a probabilidade disso acontecer!

Mas, muito antes da formatura, como acontece com todos, veio o primeiro dia de aula e o primeiro choque. O professor entrou, distribuiu algumas pilhas de apostilas, falou rapidamente sobre a disciplina e deu um conselho aos alunos vindos de escolas particulares; “aqui o rei sou eu, e vocês são meus serviçais”.

Felizmente, a grande maioria dos meus professores não era assim. Na verdade, nem aquele professor era assim. Era só jogo de cena para assustar calouros. Mas calouro é um bicho fácil de se assustar e ele não precisava ter exagerado.

Mas professores, bons ou ruins, têm uma característica peculiar, compartilhada talvez com médicos, psicólogos e outros profissionais da área de serviços: eles quase nunca observam outros colegas em ação, pois passam a maior parte do tempo em contato com seus clientes, os alunos, cujas necessidades não conhecem muito bem.

Além disso, a própria escola é uma instituição muito peculiar. Afinal, que outra empresa se livra de seus clientes em uma cerimônia pública, que chamamos de “colação de grau”?

Ainda assim, apesar de todas as idiossincrasias, é difícil imaginar instituição mais importante do que as escolas de ensino superior. De fato, o professor Steven Weinberg, ganhador do prêmio Nobel de física em 1979, certa vez disse que “se não fossem as universidades, os Estados Unidos viveriam hoje do turismo e da agricultura”.

E, de fato, de que vive o Brasil hoje, senão de turismo, agricultura e algumas coisas mais? É verdade que também exportamos aviões e outros produtos tecnológicos, mas os aviões são produzidos pela Embraer, que nasceu dentro do ITA, uma instituição de ensino superior, o que só reforça a tese do professor Weinberg.

Mas nossa história é diferente da história do ITA, da USP, da Unicamp ou da nossa irmã quase gêmea, a UFPR, mas é uma história única e autêntica, que merece ser contada.

Nascemos em 1910, como uma escola de artífices, ou seja, uma instituição desvinculada do sistema de ensino nacional, destinada apenas ao ensino profissionalizante dos “desvalidos da sorte”, para usar as palavras da época.

Progredimos aos poucos. Liceu Industrial de Curitiba, Escola Técnica Federal de Curitiba, Escola Técnica Federal do Paraná, e, em 1978, Centro Federal de Educação Tecnológica do Paraná.

Hoje, somos a Universidade Tecnológica Federal do Paraná, a UTFPR, e ainda estamos tentando entender o que isso significa, ou até mesmo como pronunciar corretamente uma sigla que quase só tem consoantes.

Ao contrário de muitas universidades do Brasil e do mundo, nascemos do esforço de técnicos, engenheiros e outros profissionais, muitos deles formados aqui mesmo.

Enquanto os brasileiros são freqüentemente acusados de praticar a autofagia, nós, na UTFPR, aprendemos a praticar a auto-regeneração.

Os mestres e doutores, necessários e importantes em qualquer universidade, começaram a chegar há pouco mais de 20 anos, e ainda estamos tentando entender o conflito entre a necessidade do ensino técnico, que sempre existiu e sempre existirá, e a nova necessidade de investimento em pesquisa pura e aplicada, que é uma das funções obrigatórias de qualquer universidade do nosso porte.

Agora, eu gostaria de voltar àquele primeiro semestre do meu curso de Engenharia. Gente, aquilo foi realmente um massacre. Dos 44 alunos que passaram no vestibular, apenas 7 foram aprovados em todas as disciplinas do primeiro período. Destes 7, apenas 3 conseguiram acabar o curso em quatro anos e meio, que era a duração mínima naquela época.

Isso não significa que nossos alunos sejam ruins. Na verdade, vocês são ótimos. O que acontece é que o curso é mesmo muito difícil e não temos intenção de torná-lo mais fácil.

Caso fizéssemos isso, correríamos o risco de começar a formar gente pior do que nós mesmos. E a finalidade de qualquer professor, em qualquer lugar do mundo, é preparar pessoas que, algum dia, serão melhores do que ele.

Mas, depois de enfrentar Cálculo, Estatística, Eletromagnetismo, Resistência dos Materiais e outras pragas, nossos alunos descobrem que ainda devem enfrentar a experiência mais aterradora de todas: as reuniões da comissão de formatura.

É difícil organizar formaturas em um curso onde as turmas-base se esfacelam ao longo do tempo. Assim, fica aqui uma menção especial a quatro alunos: Mauricio, Sandra, Diogo e Francisco. Sem vocês, essa cerimônia não teria sido possível. Os meus alunos atuais também agradecem, pois hoje é dia de aula...

A propósito, participar de uma comissão de formatura é mostra de empreendedorismo. E em algumas situações da vida profissional, isso é mais importante do que muita coisa.

E qualquer empreendedor, trabalhando em uma empresa ou por conta própria, deve em primeiro lugar se lembrar do aviso impresso na primeira página do fictício Guia do Mochileiro das Galáxias: “não entre em pânico!”.

A viagem à frente será longa, tempestuosa, difícil e arriscada, e o fracasso é o único resultado garantido. Quem se arrisca, abre para si um oceano de possibilidades, inclusive a possibilidade de sucesso. Quem não se arrisca, já fracassou.

Apesar das incertezas, o que sabemos ao certo é que um engenheiro da UTFPR pode fazer quase qualquer coisa. Nossos alunos, formados ao longo desses quase 30 anos de curso de Engenharia, estão espalhados pelo mundo, trabalhando no Brasil e no exterior. Até o momento, nenhum deles ganhou um prêmio Nobel, mas isso é só uma questão de tempo.

Para finalizar, a frase que eu tenho sempre em mente é conselho de Mário Andretti, campeão da Fórmula 1 e da Fórmula Indy, que disse: “Se as coisas parecerem estar sob controle, então é sinal que você não está indo rápido o suficiente”.

Assim, pisem forte nesse acelerador e usem o freio só em caso de emergência.

Obrigado pela paciência. Vocês são ótimos. Vida longa e próspera!