Marcelo Gleiser está de volta
O físico Marcelo Gleiser é capa da revista Época desta semana. Já tivemos outros cientistas, brasileiros ou não, aparecendo em capas de revistas semanais, como César Lattes e Stephen Hawking, mas Gleiser é nosso primeiro cientista "pop". E, ao contrário do que possam pensar os puristas, isso é bom.
Tive a oportunidade de conhecer Marcelo Gleiser quando do lançamento do livro "O Fim da Terra e do Céu", em 2001. Ao vivo, ele não tem nada de espalhafatoso, não se veste com roupas esquisitas, fala calmamente e a única afirmação escandalosa que faz, no entender de muitos, é dizer que não acredita em Deus. Ele não é pop nesse sentido de causar tumulto e, espero, nunca participará da "dança dos famosos" ou de coisa parecida. Ele é pop apenas por divulgar a ciência aos leigos e por não ter se esquecido do Brasil, mesmo morando nos EUA desde os 23 anos de idade.
O primeiro cientista pop de que se tem notícia foi Albert Einstein (1879 - 1955), criador da teoria da relatividade. Em 1919, algumas expedições destinadas a observar eclipses solares comprovaram as previsões de Einstein a respeito da deflexão da luz e ele foi rapidamente alçado ao estrelato. A personalidade de Einstein ajudou bastante nesse ponto. Espontâneo, ele não tinha medo de falar em público e a câmara gostava dele. Pouco mais tarde ele se arrependeu dessa fama súbita, que ele dizia não entender e que prejudicava suas pesquisas.
Muitos cientistas pop vieram depois de Einstein, como Richard Feynman, Carl Sagan e Stephen Hawking. Como eles, Gleiser, vivendo em uma era de crescente globalização e de comunicações instantâneas, usa a mídia a favor da educação. No próximo dia 20/08, por exemplo, ele começa a apresentar uma série de 12 episódios intitulada "Poeira das Estrelas", no Fantástico. Ainda há vida inteligente na TV aberta!
Como toda personalidade da mídia, Gleiser tem colhido sua quota de críticas. Em 1998, pouco após o lançamento do livro "A Dança do Universo", o físico Roberto de Andrade Martins, da Unicamp, publicou o artigo "Como distorcer a física: considerações sobre um exemplo de divulgação científica". O "exemplo" em questão é, naturalmente, o livro de Gleiser. Para se ter uma idéia do preciosismo a que chega Martins, ele critica Gleiser por ter usado a frase "Sabemos que o calor sempre flui de objetos quentes para objetos frios". O correto, segundo ele, seria dizer que "Sabemos que o calor sempre flui espontaneamente de objetos quentes para objetos frios". Outros exemplos citados por Martins vão na mesma linha. Como dizia Tom Jobim, "no Brasil, sucesso é ofensa pessoal", e o sucesso público de nossos cientistas ofende profundamente alguns membros da Academia.
O que me preocupa em relação à divulgação científica não diz respeito a essa minúcia de detalhes e a esse rigor, que se espera de um artigo científico, mas que é até mesmo irritante em uma obra destinada ao grande público. O que me preocupa é a dificuldade em se fazer leigos entenderem conceitos difíceis sem o uso da matemática. Um exemplo bastante conhecido é o da mecânica quântica, atualmente usada por vários místicos e autores de auto-ajuda como se fosse uma cura para todos os males, mas que não pode ser compreendida sem a resolução de vários problemas complicados. Gleiser acredita que nem todos os leitores entenderão o que ele tem a dizer, mas que o benefício produzido para muitos é maior do que o prejuízo causado a poucos.
Uma prova dos benefícios da divulgação é o caso, citado pela revista Época, de um estudante de 14 anos, chamado Leonardo Motta, que leu "A Dança do Universo" e começou a se corresponder com Gleiser por e-mail. Orientado por Gleiser, Leonardo começou a estudar física, passou no vestibular da USP e embarca mês que vem para a Universidade de Yale, onde iniciará o doutorado em física de partículas. Esse singelo benefício - outros devem existir - supera de longe qualquer falta de rigor que Gleiser possa ter cometido.
O livro mais recente de Gleiser, "A Harmonia do Mundo", segue uma linha um pouco diferente dos anteriores, pois é um romance sobre a vida do astrônomo Johannes Kepler. Aguardem comentários.
Marcelo Gleiser cometeu erros gigantescos nesse livro, e as correções do prof. Roberto Martins não se baseiam todas na do tipo que você postou. São coisas básicas como dar o crédito da constância da velocidade da luz para Einstein, algo que já havia sido formulado a muito tempo.
ResponderExcluirCaro Rafael,
ResponderExcluirEncontrar erros no trabalho dos outros é bastante simples. Na condição de membro de bancas de avaliação de projetos de fim de curso e de monografias de pós-graduação, faço isso todo semestre. Ainda assim, não vejo razão para escrever dois artigos, somando 58 páginas, apenas para expor algo que não passa de um argumento ad hominem, como o prof. Martins deixa claro no último parágrafo do seu segundo artigo.
Parabéns ao Marcelo Gleiser pelo livro, e para você também, Alvaro Augusto, por destacar o valor humano dessa obra, produzida essencialmente com o objetivo de divulgar as maravilhas do nosso universo de forma mais simplificada. Tal atitude, característica de poucos, tem inspirado diversas mentes de potencial, porém no anonimato por falta de incentivo, como no caso do jovem que você descreveu. Em relação as críticas do Prof. Roberto Martins, devo admitir que ele também está de parabéns pela precisão e clareza de raciocínio. No entanto, suas críticas deixam bem claro seu tipo de exigência, quase que exclusivo quanto ao joguete de verbos. Ou seja, isso dá a entender que uma ideia somente será correta se expressa com uso de suas palavras, ainda que inalterado o sentido. Aquele velho dilema do acadêmico apavorado tentando adivinhar qual seria a resposta do professor, ou melhor, as palavras que o professor utilizaria em determinada questão. Mas enfim, como renomado cientista e divulgador científico de sucesso, Gleiser com certeza entende que mais vale a profunda compreensão da ideia proposta do que as palavras utilizadas. Mais uma vez, parabéns!!!
ResponderExcluirÁlvaro parabenizo, ainda que tardiamente seu texto. Aliás, cheguei a ele exatamente por causa da 'polêmica' que Roberto Martins tentou criar em tono do livro de Gleiser. Sejamos sinceros, erros em obras de divulgação científica existem aos montes, aqui e no exterior. O que me parece é que há ai interesses outros que não o 'rigor' conceitual e histórico. Todos sabem que a história da ciência ė uma das recomendações do MEC para o ensino de ciência e a produção de livros didáticos. Money, nothing but a money, that's the point.
ResponderExcluirObrigado, Muitas Vozes!
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