De como o Brasil trata a ciência e a tecnologia, 1ª Parte: Marcos Pontes
Marcos Pontes, primeiro engenheiro brasileiro no espaço, é um desses brasileiros nascidos durante a corrida espacial que sonhou em fazer parte dela. Ao contrário de todos nós, ele conseguiu realizar seu sonho, ainda que não a bordo do ônibus espacial, como inicialmente planejado.
O currículo de Marcos Pontes é invejável: engenheiro aeronáutico (ITA, um dos vestibulares mais difíceis do Brasil), mestre em engenharia de sistemas (Naval Postgraduate School - NPS, Califórnia), piloto de provas, piloto militar, oficial de segurança de vôo, astronauta e condecorado com 19 prêmios, a maioria deles antes da missão espacial de 2006. Nascido em família de classe média, pouquíssimos brasileiros podem exibir currículo semelhante. Apesar disso, a maneira como Pontes foi tratado pela imprensa brasileira é humilhante.
Após a missão espacial, que recebeu críticas intensas por causa do alegado desperdício de US$ 10 milhões (metade do custo de um único traje espacial para atividade extra-veicular), Pontes resolveu passar para a reserva da Força Aérea Brasileira. A imprensa tratou a decisão como se fosse uma "aposentadoria", o que não é verdade, pois o militar da reserva pode ser chamado de volta à ativa a qualquer momento, em tempo de paz ou de guerra. Pontes, no momento o único astronauta brasileiro, e certamente o único durante muitos anos que se seguirão, foi tratado como aproveitador. Poucos jornalistas, contudo, se esqueceram de mencionar que um piloto da FAB, com todos aqueles títulos e anos de formação, ganha menos que um motorista do Planalto.
Relembrando, Pontes foi selecionado em 1998 para cumprir os seguintes objetivos: (a) treinar e representar o Brasil como astronauta junto aos outros 15 países participantes do Programa da Estação Espacial Internacional (ISS); (b) realizar como tripulante a primeira missão espacial brasileira; (c) realizar experimentos nacionais, que não foram desenhados por ele, a bordo da ISS.
Tendo cumprido todos esses objetivos, com excelente desempenho, a missão para a qual Pontes foi selecionado está cumprida. O dinheiro foi investido e bem gasto, e Pontes pode fazer de sua vida o que bem quiser, como todos nós. E o Brasil ganha, de quebra, um especialista em missões espaciais, com conhecimento de ponta e treinamento de primeira, coisa que nunca tivemos.
Seria interessante se Pontes tivesse recebido um décimo do tratamento reservado a nossos jogadores de futebol ora na Alemanha em busca de mais um títutlo internacional. Embora realizem missões que exigem dotes intelectuais infinitamente menores, e ganhem uma soma de dinheiro infinitamente maior, nossos jogadores são tratados como heróis, capazes de paralisar as atividades do país durante os jogos. Nosso astronauta, em vez disso, é tratado como vigarista.
É preciso que o Brasil aprenda a ter um mínimo de respeito por ciência e tecnologia. É preciso ensinar isso às criancinhas, aos adolescentes e aos adultos. É preciso que os jornalistas parem de falar de coisas que não entendem e que os chefes do executivo parem de se preocupar com futebol, e passem a se preocupar também em erguer troféus de modalidades científicas e tecnológicas.
Caso contrário, estaremos para sempre condenados a dirigir automóveis alemães e de outras nacionalidades, a pilotar computadores norte-americanos, equipados com software também norte-americano, a voar em espaçonaves russas e a tentar aumentar o saldo da nossa balança comercial exportando commodities e importando todo o resto.
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