O dia seguinte
Então, as torres caíram. Na época, escrevi um artigo bem intencionado, que hoje me parece otimista demais, intitulado "Hoje sou americano, hoje sou muçulmano". Por coincidência, no mesmo dia o Le Monde estampou em sua primeira página a manchete "Hoje somos todos americanos". Contudo, as chuvas de bombas que cairam posteriormente no Afeganistão e no Iraque tornaram muito difícil nos solidarizarmos com os norte-americanos. Da mesma forma, as freqüentes ameaças da Al-Qaeda e o atentado ao metrô de Londres tornaram muito difícil nos solidarizarmos com os radicais islâmicos. Hoje, de ambos os lados do Atlântico, todos são terroristas.
No dia seguinte ao 11 de setembro, as bolsas de valores caíram, a economia entrou em recessão, o leilão de privatização da Copel (Companhia Paranaense de Energia, única empresa energética posta à venda e não vendida) resultou vazio. Mais tarde, algum paranaense ilustre mencionou que "foi um ato de Deus que impediu a privatização". Estranho Deus esse, que condena milhares de pessoas à morte com o objetivo de garantir o emprego de outras milhares. Não foi assim que me ensinaram no catecismo!
O mundo após o 11 de setembro é muito pior. Antes, tínhamos ao menos alguns chefes de estado ensaiando passos de estadistas. Tínhamos promessas e chances de integração entre as Américas e uma Organização Mundial do Comércio progressivamente liberal. Hoje, temos Chávez, Morales e Lula. Temos protecionismo e rodadas da OMC canceladas. Nos EUA, tínhamos um presidente eleito de maneira fraudulenta, sem apoio popular e sem nada a fazer a não ser se esconder nas moitas da Casa Branca, jogar golfe e esperar o fim do mandato. Hoje, temos um herói da luta contra o terrorismo, que deve estar repetindo até agora, para si mesmo, entre um prezzel e outro, "não contavam com a minha astúcia!".
Após o 11 de setembro, coisas incríveis aconteceram. Vimos o país mais rico do mundo se lançar em guerra contra dois dos mais pobres, em busca do chefe da Al-Qaeda, que nunca foi encontrado, e de armas de destruição em massa, que nunca existiram. Vimos passageiros sendo revistados dos pés à cabeça antes de embarcarem em um avião, só para se sentarem calmamente e receberem facas e garfos metálicos para o jantar. Vimos a canção Imagine, de John Lennon, sendo banida das rádios e TVs norte-americanas, sob alegação de "letra questionável". A lista completa de canções banidas (ou "não recomendadas", para ser mais exato) indica o nível de neurose atingido após o ataque terrorista. Mas essa é uma era neurótica e não devemos nos espantar. Mesmo assim, se Yeshua e Muhammad (ou Jesus e Maomé) soubessem o que seria feito em nome deles, o primeiro teria voltado a martelar pregos e o segundo teria acabado seus dias como um comerciante anônimo na região de Meca.
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