Alguns comentários sobre consumidores especiais
O limite atualmente imposto para que um consumidor de energia elétrica possa ser caracterizado como livre é pertencer ao Grupo A (Alta Tensão), ser atendido em tensões iguais ou superiores a 69 kV e ter demanda contratada igual ou superior a 3 MW. Adicionalmente, consumidores instalados após 1995 também podem se tornar livres, independentemente da tensão, desde que respeitado o limite de demanda igual ou superior a 3 MW. A energia absorvida por esses consumidores livres convencionais é denominada energia convencional.
Uma modificação importante foi introduzida com a outorga da Lei 9.427/1996, que teve sua redação consolidada pela Lei 10.762/2003 e pelo Decreto 5.163/2004. Esta lei definiu que certas fontes de energia alternativa poderiam atender consumidores com carga maior ou igual a 500 kW, em qualquer tensão. Tais consumidores passaram assim a se enquadrar efetivamente na condição de livres, desde que atendidos diretamente por essas fontes de energia alternativa, que são: Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs, usinas com potência instalada entre 1 MW e 30 MW e com área do reservatório inferior a 3 km2), Minicentrais Hidrelétricas (usinas com potência instalada inferior a 1 MW, oficialmente denominadas Centrais Geradoras Hidrelétricas – CGHs) e usinas solares, eólicas ou de biomassa com potência injetada na linha de transmissão ou distribuição inferior a 30 MW.
Os consumidores atendidos por fontes alternativas têm sido denominados pela ANEEL e por outros agentes do mercado de consumidores especiais, como forma de diferenciação dos consumidores livres atendidos por energia convencional. O principal atrativo desse mercado é que, ao serem atendidos por fontes de energia alternativa, os consumidores têm direito a um desconto não inferior a 50% sobre a parcela “fio” da Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD, medida em R$/kW). Por causa de tal desconto as fontes alternativas foram renomeadas para fontes incentivadas, pois muitos produtores entendiam que o termo “alternativa” denotava um fornecedor de qualidade inferior, o que certamente não é o caso.
Em 2009, com a promulgação da Lei 11.943, que deu nova redação à Lei 9.427/1996, os consumidores especiais passaram a poder ser atendidos também por usinas hidrelétricas com potência instalada entre 1 MW e 50 MW, sem características de PCH, e por usinas solares, eólicas ou de biomassa com potência injetada entre 30 MW e 50 MW. Nesse caso, porém, o desconto na TUSD é perdido e a energia contratada é limitada a 49% da energia média produzida pela usina (os restantes 51% devem ser adquiridos de fontes incentivadas).
Quanto ao desconto na TUSD, existem dois tipos. As usinas que entraram em operação antes de 31 de dezembro de 2003 têm direito a um desconto máximo de 100% sobre a parcela “fio” da TUSD. As demais usinas têm direito a um desconto máximo de 50% sobre a mesma parcela. Tais descontos são transferidos das usinas para os respectivos consumidores por elas atendidos, ou seja, consumidores atendidos por usinas com desconto de 100% têm direito a desconto de 100%, e consumidores atendidos por usinas com desconto de 50% têm direito a desconto de 50%.
Apesar do incentivo tarifário, as primeiras unidades de consumidores especiais foram modeladas no MAE (atual CCEE) somente no início de 2003, atendidas por meio da energia gerada pela PCH Pesqueiro, localizada no rio Jaguariaíva, Paraná. Nem a PCH Pesqueiro nem as unidades consumidoras eram, na época, agentes do MAE, e ambas passaram a ser representadas no MAE por meio da Electra Energy, a verdadeira pioneira no atendimento a consumidores especiais.
Muitos problemas se seguiram, pois o atendimento a consumidores especiais não era totalmente regulamentado na época. O desconto na TUSD, por exemplo, foi regulamentado somente em agosto de 2004, pela Resolução Aneel 77, o que significa que os primeiros consumidores especiais atuaram durante algum tempo sem desconto algum.
Uma das primeiras providências tomadas pela ANEEL para garantir o atendimento dos consumidores especiais foi exigir que os contratos de compra e venda de energia fossem registrados naquele órgão antes da modelagem da carga na CCEE. A ANEEL passava assim a atuar como garantidora de que o consumidor era realmente atendido por uma fonte incentivada, tendo direito à modelagem na CCEE e ao desconto na TUSD.
Outro problema era que a CCEE não conseguia separar energias convencional e incentivada em seu processo de contabilização, o que abria lacunas para o aproveitamento indevido de montantes de energia convencional, que poderiam ser vendidos a consumidores especiais como se fossem energia incentivada. A situação foi finalmente regulamentada pela Resolução ANEEL 247/2006, que, dentre outras providências, disciplinou os Contratos de Compra de Energia Incentivada (CCEI), tornou obrigatória a instalação do Sistema de Medição e Faturamento (SMF) do consumidor e determinou que a CCEE deveria alterar suas regras e procedimentos de comercialização de modo a adequá-las ao atendimento dos consumidores especiais.
Após o início conturbado, o mercado de consumidores especiais consolidou-se e continua em crescimento, por duas razões principais. A primeira é aquela que existiu desde o início, ou seja, a obtenção de prêmios de economia em relação ao mercado cativo. A segunda é uma maior profissionalização de algumas comercializadoras de energia, que deixaram de ver os consumidores especiais como um mercado secundário e passaram a vê-los como um mercado importante. Prova disso é que, hoje, dos 938 agentes consumidores modelados na CCEE, mais de metade são consumidores especiais, número que cresceu 95% em relação ao início de 2009.
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