domingo, janeiro 24, 2010

Deus, Haiti e outras coisas

A estupidez humana é sempre uma constante, mas é nas grandes tragédias que ela se manifesta com total intensidade. No caso do terremoto do Haiti, excluindo-se as bobagens de sempre, como aquela que diz que um ato divino impediu a destruição do crucifixo da igreja onde estava Zilda Arns, algumas outras são muito mais preocupantes. É o que relata o físico Marcelo Gleiser em sua coluna de hoje. De acordo com ele o pastor evangélico Pat Robertson atribuiu o terremoto a uma punição divina contra os haitianos, que teriam assinado um pacto com o diabo para conseguir a independência dos franceses.

Atribuir a causa de um terremoto a um povo pobre como o haitiano é o que há de mais cruel em uma hora dessas. Eu diria até que se trata de uma atitude anti-cristã. Mas, em todo caso, se Deus quer realmente punir os pecadores, por que não produzir um terremoto em Los Angeles? Ou em Las Vegas (the "Sin City")?

O que não conseguimos entender é que tragédias como o terremoto do Haiti, o tsunami de 2004 e todo o resto são apenas consequência das leis da física e de um monte de acidentes. Leis da física e um monte de acidentes, nada mais. Em escala planetária, e longe de querer menosprezar o sofrimentos das vítimas, essas tragédias seriam vistas como eventos muito pequenos. Se visto do espaço, qualquer terremoto teria parecido com um tremor seguido de uma acomodação de rochas. Se visto do espaço, qualquer tsunami teria parecido com uma leve "lambida" dada pelo oceano nas margens de algumas ilhas e continentes. Somos cosmicamente insignificantes e, mesmo assim, queremos que o Cosmos se curve à nossa vontade.

Talvez já esteja na hora de entendermos que o Universo não foi construído de acordo com nossas especificações e que o planeta não gira em torno de nós. Talvez já esteja na hora de pararmos de dizer a Deus o que ele deve ou não fazer e começarmos a nos preocupar com as duas perguntas que realmente importam em casos de terremotos, furacões, inundações e outras tragédias: (1) Como nos precavermos dessas tragédias, caso possível? (2) O que fazer para minimizar o impacto dessas tragédias, caso ocorram novamente?

Essas são as perguntas que realmente interessam. Todas as outras, ex-ante ou ex-post, não passam de conversa fiada.

Um comentário:

  1. Não devemos esquecer que na costa leste dos Estados Unidos existe a famosa Falha de San Andreas, que já alimentou previsões sobre um terremoto de proporções inimagináveis. Se o tal terremoto um dia vier acontecer, pode escrever que dirão que Deus não esqueceu de Los Angeles e Cia., mas estava preparando um terremoto à altura dos pecados deles. O ser humano só enxerga o que quer, infelizmente.

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