O Livre Mercado de Energia Elétrica Brasileiro – Parte V: Comercializando Energia
O processo de compra de energia por parte de um consumidor cativo é muito simples, envolvendo apenas o consumidor e uma distribuidora de energia. No caso de um consumidor livre, o processo gera economias e é bastante mais flexível, mas, por envolver mais de um agente, torna-se um pouco mais complicado, exigindo assessoria especial.
Digamos que um consumidor C, na área de concessão de uma distribuidora D1, queira adquirir energia elétrica de um gerador G, na área de concessão de uma distribuidora D2. O processo de comercialização é o seguinte:
1. A energia é entregue fisicamente a C por D1.
2. C paga a D1 pelo serviço de acesso à rede, por meio de uma tarifa regulada conhecida como TUSD (Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição).
3. G deve pagar a D2 pelo acesso à rede, também por meio de uma TUSD do gerador.
4. C e G assinam um contrato de compra e venda de energia, negociando livremente preços, prazos e demais condições.
5. No final do mês, C divulgará seus dados de consumo de energia (CE), os quais serão confrontados com o montante mensal contratado (M) junto ao gerador. Se CE>M, terá faltado energia contratada, e C terá entre 10 a 15 dias para providenciar um contrato adicional de curto prazo. Se M>CE, terá sobrado energia contratada, e C terá entre 10 a 15 dias para tentar negociar as sobras de energia (consumidores não podem comercializar energia diretamente, mas isso pode ser feito por meio de uma comercializadora).
6. Se CE>M e C não tiver conseguido contratos de curto prazo, ele ficará "exposto" aos preços mensais determinados pela CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica). Isso significa que o déficit de contratação será faturado pela CCEE, ao preço do mês, cerca de 40 dias após o encerramento do mês comercial. Adicionalmente, a CCEE cobrará uma penalidade por insuficiência de contratação (R$ 77,70/MWh, tarifa de 2007).
7. Se M>CE e C não tiver conseguido negociar suas sobras, estas serão faturadas pela CCEE ao preço do mês, também cerca de 40 dias após o fechamento do mês. Nesse caso não haverá penalidade.
8. Como os contratos de compra e venda de energia são livremente negociados, uma condição usual é que haja uma certa flexibilidade (digamos, +/- 10%) em torno do valor mensal contratado M. Os desvios em torno desse valor dão origem ao mercado de curto prazo (antes da atuação da CCEE), que no Brasil atual funciona como um mercado de balcão, onde geradores, consumidores e comercializadoras oferecem montantes e preços. Em mercados mais desenvolvidos já há verdadeiras "bolsas de energia", onde contratos multilaterais de curto prazo são firmados. Um dia chegaremos lá, mas por enquanto nosso mercado não tem liquidez suficiente.
Pode parecer um pouco complicado no começo, mas o funcionamento é bem parecido com o de uma bolsa de commodities convencionais, com a diferença de que os preços da energia variam semanalmente (não diariamente, como em uma bolsa de commodities) e é formado um preço médio ao final do mês. O papel da CCEE, que funciona como uma câmara de compensação, é assegurar a liquidação mensal do mercado, com montantes consumidos confrontados aos montantes gerados e sobras e déficits alocados aos agentes responsáveis.
No próximo artigo falaremos um pouco mais sobre as fontes de energia incentivada, que deram origem a um mercado interessante, atraente e de baixo impacto ambiental.