Tomei contato com o livro "Quem Mexeu no meu Queijo" por volta do segundo semestre de 2001. Na época, não me pareceu leitura suficientemente importante para que eu me ocupasse dela, mas o livro sempre me perseguiu. Ele está à venda em farmácias e supermercados e, tenho que confessar, quase o comprei certa vez. Mas resisti bravamente à tentação. Recentemente, por volta do final de 2002, o livro do queijo começou a ser mencionado por vários participantes de várias listas de discussão e minha curiosidade foi aguçada.
O que se segue é uma análise pessoal desse livro que "mobilizou multidões", baseada na leitura de uma cópia cedida por um colega (sim, ainda não gastei meus preciosos trocados no livro!). Partes dela foram divulgadas em listas de discussão na internet, o que me causou muita dor de cabeça. Há muitos discípulos do queijo por aí! Ao leitor interessado, advirto que não se trata de desmontar um Hamlet ou um Ulysses, nem de qualquer outra grande obra da literatura universal. Shakespeare e Joyce já estavam por aqui muito antes de Spencer Johnson, e continuarão presentes depois que este último tiver desaparecido do mundo editorial.
Os norte-americanos são realmente gente esperta. Há anos eles nos vendem "fast food" e tentam nos convencer de que aquilo é comida de verdade. Consomem milhares de horas de futebol americano, boxe e baseball por ano, como se aquilo fosse esporte de verdade. Vendem-nos rap e hip-hop como se aquilo fosse música. Já faz algum tempo, também, que eles aprenderam a vender pequenas brochuras como se fossem livros. De fato, o livro "Quem Mexeu no Meu Queijo", um best seller de 1998, quando digitado com uma fonte de tamanho normal, não tem mais do que 20 páginas. Colocado em formato TXT, por exemplo, e eliminando os espaços em branco, sobrarão apenas 18 páginas, incluindo prefácio, dedicatória e toda a encheção de lingüiça usual. Para publicá-lo em formato de um livro de 96 páginas, foi necessário usar letras garrafais e formatar o texto em parágrafos curtos, de duas ou três linhas. Um cálculo rápido mostra que cerca de um terço do texto de 18 páginas é composto de espaço em branco. Fantástico! Irrelevância e espaço em branco à venda por apenas US$ 14 (US$10 em algumas
lojas eletrônicas e cerca de R$ 20 para a edição brasileira). Melhor do que essa idéia, nem mesmo aquela de enlatar ar da Amazônia e vendê-lo por um dólar.
Ao contrário do ar enlatado, esse livro sobre ratos, anões e queijo virou mania nos EUA e em outros países. Há vídeos e seminários de treinamento para quem estiver disposto a derreter o próprio cérebro como se fosse fondue. Várias empresas adotaram o livro como leitura obrigatória e embarcaram na onda da "mudança do queijo". E não se trata somente de empresas de pequeno e médio portes, mas também de gigantes de grosso calibre, como Laboratórios Abbot, Bell South, Exxon, Georgia Pacific, Lucent Technologies, Marriot Hotels, Mobil Oil, Texaco, além de hospitais e órgãos governamentais. Nem é preciso mencionar que o website do livro apresenta uma seção de venda de "produtos de queijo", no melhor estilo norte-americano: post it personalizado em forma de queijo suíço, canetas, camisas, canecas, calendários e até um planejador pessoal que custa a bagatela de US$ 110.
Eu imagino que um dos apelos do livro, se não o único, são as credenciais do autor. Spencer Johnson é bacharel em psicologia pela University of Southern California e MD (Medical Doctor) pelo Royal College of Surgeons. Ele é o autor de "O Gerente Minuto", um daqueles livros que as pessoas compram em aeroportos e rodoviárias quando as palavras cruzadas acabaram. Nessa mesma linha, seguiram-se "O Vendedor Minuto", "O Pai Minuto", "O Professor Minuto" e "A Mãe Minuto" e outros. Estimativas indicam que os livros de Johnson já venderam mais de 11 milhões de exemplares em todo o mundo. Contando que ele tenha recebido cinqüenta cents por livro (uma estimativa bem por baixo), ele deve ser atualmente o dono de uma pequena fortuna de US$ 5,5 milhões. Destes milhões todos, pelo menos um quarto deve ter vindo de "Quem Mexeu no meu Queijo". Minha estimativa, é claro, não leva em conta todos os milhões que devem ter vindo da venda de toda a parafernália associada ao livro. Auto-ajuda realmente é um grande negócio, e um excelente método para "auto-ajudar" o autor...
O prefácio do livro é escrito por Kenneth Blanchard, PhD, que também é co-autor de "O Gerente Minuto". Esses títulos acadêmicos confundem as pessoas. Elas pensam: "Puxa, o autor é MD, o livro foi prefaciado por um PhD. Deve haver algo de profundo aqui que eu ainda não percebi". Coisa parecida acontecia com as palestras de um certo palestrante motivacional brasileiro que se intitulava PhD (não estou dizendo que Spencer Johnson não seja MD). Esse palestrante retratava o óbvio, mostrava estatísticas erradas ou antigas, atirava-se apressadamente a conclusões duvidosas. Mas fazia tudo isso de uma maneira tão empolgante que deixava as pessoas confusas. Ninguém tinha coragem de declarar abertamente que a coisa toda não passava de ar quente, mas as "conversas de banheiro", logo após as palestras, não deixavam dúvidas de que muita gente só estava ali porque a empresa havia pago a conta. Além disso, sempre era uma ótima oportunidade para se livrar de um dia ou de uma manhã de trabalho! Naturalmente, não tenho idéia do que as mulheres falavam nessas conversas de banheiro, mas não deve ser nada muito diferente.
Isso não significa que devamos defenestrar todos os PhDs, MDs e MBAs. De fato, vários autores deliciosos, dentro e fora do Brasil, envergam títulos acadêmicos importantes, tais como Isaac Asimov, Richard Dawkings, Carl Sagan, Marcelo Gleiser, Clemente Nobrega e vários outros. O importante é ler o que eles escrevem e deixar os títulos acadêmicos de lado. Depois da leitura, compare o resultado com os títulos e, somente então, use estes últimos para certificar o autor. Certificar o autor antes da leitura é como um encontro às escuras. No mundo acadêmico, em particular, quando aceitamos a opinião de alguém com base apenas nas credenciais acadêmicas, estamos falando de um "argumento de autoridade". Coisa feia que já deixou muita gente boa em maus lençóis.
Além dos argumentos de autoridade, outro fator que me deixa preocupado é a homogeinização de opiniões em relação do livro do queijo. Comecei a ficar preocupado quando muita gente diferente, em muitas listas de discussão diferentes, começou a recomendar o livro. Há até mesmo versões DOC, PDF e RTF circulando por aí. Uma rápida pesquisa na internet mostra que a grande maioria das pessoas concluiu que o livro é realmente "uma parábola simples que revela verdades profundas sobre mudança". Isso é realmente incrível! Nem mesmo a Bíblia conseguiu tamanha unanimidade. Se os governantes mundiais aprendessem como fazer esse tipo de lavagem cerebral, todas as guerras seriam desnecessárias. De qualquer forma, fica aqui uma sugestão a George W. Bush: em vez de gastar US$ 300 bilhões para invadir o Iraque, basta enviar 20 milhões de cópias de "Quem Mexeu no meu Queijo" para os iraquianos, e estes serão imediatamente transformados em paçocas ambulantes. Depois é só pisar em cima e varrer...
O livro: um resumo comentado
Quando eu comecei a ler o livro, tarefa que não me tomou mais de meia hora, tive a impressão de que aquilo não passava de uma história para crianças. Depois de algumas páginas, contudo, percebi que, bem, aquilo não passava de uma história para crianças... É difícil saber o que é mais desconfortável: ler a história dos ratos e duendes (que se espalha por apenas 10 páginas e contém a "essência" do livro), ou ler o debate que se segue, envolvendo vários antigos colegas de uma turma de High School, dentre eles um tal Michael que é quem conta a história do queijo. Estes, supostamente, são os "seres pensantes" do livro, mas há uma superficialidade incômoda no que eles dizem, uma superficialidade indigna de seres humanos.
A história se passa em um labirinto habitado por dois ratos, Sniff e Scurry, e dois duendes, Hem e Haw. A tarefa dos quatro personagens é sair todos os dias em busca de queijo, que parece ser o único alimento desses pobres diabos. Talvez as confusões em que eles se metem sejam decorrentes da falta de proteínas adequadas, as quais estariam presentes em uma dieta mais equilibrada. Talvez também sejam decorrentes da falta de fibras, que causaria prisão de ventre. Mas isso é só especulação.
Os ratos, segundo o autor, usavam o "simples método da tentativa e erro". Aí está o primeiro problema do livro: o método da tentativa e erro não tem nada de simples e é usado universalmente em várias situações de pesquisa científica. Esse método deveria ser mais encorajado em nossas escolas. Não se trata, obviamente, do método de tentativas aleatórias como Johnson deixa subtendido. Mas esse assunto daria uma tese de mestrado e é melhor seguir em frente.
Um belo dia, grandes quantidades de queijo começam a aparecer em um lugar chamado Posto C. Todos os personagens adaptam-se imediatamente à essa situação, mudam-se para mais perto do Posto C e vivem uma vida feliz (até onde é possível levar uma vida feliz presos em um labirinto). Mas essa não é a mudança de que trata o livro. O problema é que em uma certa manhã, o queijo desaparece do Posto C e, frente a essa mudança, os personagens tomam atitudes diferentes.
Os ratos Sniff e Scurry partem imediatamente à procura de queijo em novos lugares do labirinto. Ao fim de algum tempo, acabam por encontrá-lo. Haw e Hew, duendes dotados de cérebros e que deveriam pensar melhor do que ratos, são mais lentos em perceber a mudança. Hem deseja ficar no território conhecido, aferrado às suas crenças e na esperança de que o queijo volte a aparecer no Posto C. Haw, por sua vez, procura adaptar-se à mudança e é dele que saem as fantásticas conclusões do livro. A primeira lição parece-me clara, mas não é mencionada
pelo autor: "Em situações de mudança, é melhor agir como ratos!". Bem, é isso que acontece nas empresas, não é? Quando começa a dança das cadeiras, os verdadeiros ratos são os primeiros a agir: apunhalam-se pelas costas, colocam a culpa em outros ratos, abandonam o navio, etc.
Durante seu lento processo de adaptação, o duende Haw começa a escrever "ensinamentos" nas paredes do labirinto. O primeiro deles é: "QUANTO MAIS IMPORTANTE SEU QUEIJO É PARA VOCÊ, MENOS VOCÊ DESEJA ABRIR MÃO DELE". Uma frase de efeito, mas que é na verdade uma tautologia e poderia ser escrita como "QUANTO MAIS IMPORTANTE SEU QUEIJO É PARA VOCÊ, MAIS IMPORTANTE SEU QUEIJO É PARA VOCÊ!"
Outra frase que vai parar na parede do labirinto é "SE VOCÊ NÃO MUDAR, MORRERÁ". Contudo, nem o autor e nem os duendes se esforçam muito para mostrar que a frase está incompleta. A verdade é que "SE VOCÊ NÃO MUDAR, MORRERÁ, MAS SE MUDAR, PODERÁ MORRER TAMBÉM!"
O mundo está cheio de empresas que se adaptaram à mudança e se deram bem, mas também está cheio de empresas que se adaptaram e morreram. A situação, portanto, não é tão simples quanto o Dr. Johnson deixa transparecer. Imagine que você fosse um grande fabricante de carroças e carruagens, vivendo nos EUA por volta do final do século XIX, quando os primeiros automóveis começaram a aparecer. O que você teria feito, face a essa enorme ameaça ao seu negócio? É fácil fazer o post mortem e dizer que você deveria ter abandonado as carruagens e começado a fabricar automóveis, mas quem poderia garantir que os automóveis dariam certo? Quem poderia garantir que as pessoas abandonariam ruas cheias de um cheiro infernal de esterco em favor de ruas cheias de um cheiro infernal de fumaça? Além disso, deixar de fabricar carruagens e passar a fabricar automóveis implicaria no investimento de grandes somas de dinheiro. Se o negócio não desse certo, o processo de adaptação à mudança somente teria acelerado a morte da empresa. De fato, na época de maior crescimento da Ford, por volta de 1910, existiam mais de 2.000 fabricantes de automóveis nos EUA. Alguns anos depois, só
existiam quatro. O que aconteceu com todos os outros fabricantes que se adaptaram à mudança?
Esse problema de não se saber a priori se devemos nos adaptar a uma mudança é o que Clayton M. Christensen chamou de "Dilema do Inovador", em um livro homônimo. Clemente Nobrega afirma que este é o melhor livro de administração escrito nos últimos 15 ou 20 anos [6]Chistensen também comenta que "É simplesmente impossível prever com qualquer grau razoável de precisão como inovações desse tipo (no caso, o microprocessador) serão usadas ou quão grandes serão seus mercados". O mundo real não é nada parecido com o mundo do queijo.
Voltando às frases que o duende Haw escreve nas paredes do labirinto, há uma particularmente intrigante: "O MOVIMENTO EM UMA NOVA DIREÇÃO AJUDA-O A ENCONTRAR UM NOVO QUEIJO". Mas como ter certeza disso? Claramente, o movimento em uma nova direção pode conduzir mais rapidamente a uma morte rápida. Há também frases com um toque New Age: "IMAGINAR-ME SABOREANDO O NOVO QUEIJO, ANTES MESMO DE ENCONTRÁ-LO, CONDUZ-ME A ELE". Sinto aqui uma incômoda lembrança dos gurus que dizem que a mentalização cria a realidade. Além disso, se o queijo é novo, e se o duende nunca teve contato com ele (no livro, há vários sabores de queijo), como ele poderia saber que sabor o queijo teria? Bem, pelo menos devemos ficar contentes que Johnson não tenha invocado os experimentos da Física Quântica ou milenares ensinamentos chineses para validar o que diz.
No fim do texto sobre ratos e duendes, que fica bem perto do começo, o duende Haw escreve na parede um resumo do seu aprendizado:
1) A MUDANÇA OCORRE - CONTINUAM A MEXER NO QUEIJO
2) ANTECIPE A MUDANÇA - PREPARE-SE PARA O CASO DO QUEIJO NÃO ESTAR NO LUGAR.
3) MONITORE A MUDANÇA - CHEIRE O QUEIJO COM FREQUÊNCIA PARA SABER QUANDO ESTÁ FICANDO VELHO.
4) ADAPTE-SE RAPIDAMENTE À MUDANÇA - QUANTO MAIS RÁPIDO VOCÊ SE ESQUECE DO VELHO QUEIJO, MAIS RÁPIDO PODE SABOREAR UM NOVO.
5) MUDANÇA - SAIA DO LUGAR ASSIM COMO O QUEIJO!
6) APRECIE A MUDANÇA - SINTA O GOSTO DA AVENTURA E DO NOVO QUEIJO
7) ESTEJA PREPARADO PARA MUDAR RAPIDAMENTE MUITAS VEZES - CONTINUAM
MEXENDO NO MEU QUEIJO.
Aí está uma receita fechada e enunciada à moda dos livros de auto-ajuda. Só que é também a receita perfeita para criar um autômato perfeito. A mudança ocorreu? Adapte-se! Ocorreu de novo? Adapte-se de novo e infinitum ad nauseum.
No prefácio do livro, Kenneth Blanchard diz que o queijo é uma metáfora para o que queremos ter na vida: um emprego, um relacionamento, dinheiro, uma casa grande, liberdade, saúde, reconhecimento, paz espiritual ou uma atividade como corrida ou golfe. A receita é que adaptar-se às mudanças é o caminho certo. Por outro lado, se você ficar questionando a mudança, será tratado como um cabeça-de-vento, como o duende Hem.
E é aí que surge o grande mecanismo de defesa do livro. Imagine uma reunião em uma empresa qualquer, onde um dos participantes (um consultor qualquer, mas fartamente nutrido com queijo) conta uma história de um executivo de uma empresa que riu dele quando sugeriu que adotassem o programa do queijo. A empresa entrou posteriormente em uma era revolucionária, o executivo em questão viu que não tinha mais lugar e foi afastado. Moral da história: livre-se das pessoas que resistem à mudança - e que não gostaram do livro - , ou simplesmente deixe que vão embora (tradução: torne o ambiente de trabalho insuportável para elas). Não resista à mudança, ou os discípulos do queijo o ridicularizarão e o chamarão de Hem. Por outro lado, se você for como Haw, e fizer tudo o que a empresa manda, e se adaptar direitinho a todas as mudanças, aí sim você terá lugar nas empresas do queijo!
Os caçadores-coletores do mundo do queijo
Um fato que fica evidente logo na primeira página do livro é que o mundo do labirinto jamais poderia servir como metáfora do mundo atual. O mundo de Hem, Haw, Sniff e Scurry é o mundo dos caçadores-coletores que percorriam as savanas africanas há mais de dez mil anos. Depois disso, o mundo passou pela revolução agrícola, pela revolução industrial e pela revolução da informação. Embora alguns grupos de caçadores-coletores ainda subsistam, no deserto do Kalahari, em Papua Nova Guiné e em outros lugares, a maioria esmagadora da humanidade
não é mais composta de indivíduos que passam os dias em busca daquilo que a natureza oferece. Nós aprendemos a domar a natureza e esse é o ensinamento fundamental que os habitantes do labirinto jamais aprenderam.
O mundo do labirinto é um mundo de nômades que nunca param para se perguntar porque o queijo aparece em tais e tais lugares. Eles nunca questionam quem coloca o queijo lá ou porquê. Nunca lhes ocorre como poderiam eles mesmos fabricar o queijo. Nunca se perguntam como poderiam sair do labirinto. Em resumo, eles nunca se perguntam como poderiam eles mesmos causar as mudanças, em vez de ficarem se adaptando, se adaptando, se adaptando.
Alguém pode argumentar que eu estou forçando demais e que o labirinto é apenas uma metáfora. Pode ser. Mas o problema é que metáforas podem ser perigosas. Metáforas são úteis para facilitar o processo de aprendizado, mas correm o risco de serem encaradas como a coisa real. Se tudo der certo, o leitor saberá fazer a transição para o novo, que é o que uma metáfora prega. Mas se não der certo, o leitor ficará preso em uma realidade artificial e altamente simplificada, da qual não tem nada a aprender.
Um mundo complexo avesso a receitas prontas
A receita básica dos livros de auto-ajuda é constatar que as pessoas estão perdidas e algumas estão suficientemente perdidas para gastar US$ 10 ou US$ 20 em um livro. De fato, as pessoas estão desesperadas. Vivemos em um mundo complexo que não para de mudar e muitos de nós - senão todos - perderam as referências. A pergunta que todos fazem é: "O que devo fazer da minha vida? Qual a receita?". O autor de auto-ajuda é o espertalhão que responde essa pergunta que nenhum psicoterapeuta de algum valor se atreveria a responder.
A raiz do nosso desconforto começou a nascer em algum ponto da década de 80, com o início da liberalização econômica, o fim da guerra fria e a fragmentação dos regimes socialistas. No decorrer de poucos anos, o mundo ficou maior e muito mais interconectado. As pessoas começaram a perceber que sempre tinham vivido em guetos. Mudança sempre houve na história da humanidade. O diferente agora - foi Alvin Toffler que esclareceu a questão - é a rapidez com que a mudança ocorre. A sensação de que havia uma receita pronta para cada problema acabou. Talvez nunca tenha existido, mas agora sabemos que acabou.
A única certeza que temos é que as coisas mudam e vão continuar mudando. Algumas mudanças não podemos evitar, como aquelas advindas de uma guerra no Oriente Médio ou do fato de se ter um partido de esquerda do poder. Mas as mudanças discutidas por Johnson parecem ser muito mais triviais do que essas. Do ponto de vista de um gerente que precisa administrar o moral durante uma fusão ou reestruturação empresarial, o livro do queijo parece ser um prato cheio, pois prega a receita simples de “adapte-se ou morra”. Essa falsa dicotomia, decorrente de uma supersimplificação do raciocínio, exclui alternativas adicionais. Em uma fusão de empresas, por exemplo, os funcionários podem decidir não se adaptar nem morrer, mas simplesmente pular fora. Uma alternativa mais trabalhosa poderia envolver tentativas de interferir no processo de mudança, o que certamente não é para todos.
Seres humanos não são ratos em busca de queijo. Nossas motivações e desejos são muito mais complexos. Freqüentemente não sabemos porque fazemos aquilo que fazemos. Freqüentemente não sabemos o que fazer em várias situações. Freqüentemente adaptar-se pode ser até a solução mais viável, mas encarar sempre a adaptação como o único caminho possível é indigno de seres dotados de cérebros muito maiores do que os de ratos.