Marcos Pontes, o astronauta brasileiro
Deixei para escrever sobre esse assunto somente agora, quando já ficou claro que Marcos Pontes retornou em segurança e a possibilidade de um desastre está definitivamente afastada. Afinal, com aqueles espaçonaves russas, remendadas com fita crepe e durepóxi, nunca se sabe.
Em primeiro lugar, tenho que admitir que Pontes é realmente um cabra macho da melhor espécie. Além de ter coragem suficiente para subir em uma nave russa, para agüentar toda a lenga-lenga oficial, para dar centenas de entrevistas e para posar para centenas de fotos, imagino o inferno pelo o qual ele deve ter passado para conseguir arrancar aqueles US$ 10 milhões do governo.
A mídia tem tratado a missão como desperdício de dinheiro, esquecendo-se de mencionar que, se essa soma não fosse gasta com Pontes, certamente não seria gasta com saúde, educação e muito menos com pesquisa científica. O dinheiro provavelmente se perderia nos subterrâneos de Brasília e nunca mais ouviríamos falar dele.
Eu também oscilei para lá e para cá em relação ao assunto, provavelmente por causa de ciúmes, mas quando vi um importante colunista brasileiro declarar que "já mandaram até macaco para o espaço", tive que me decidir por Pontes. Afinal, ele é engenheiro e entusiasta da educação. Sendo eu engenheiro e professor, não posso deixar de emprestar meu singelo apoio, ainda que irrelevante.
Cabe mencionar também que, embora US$ 10 milhões possam fazer a felicidade financeria de qualquer pessoa, trata-se de uma soma irrisória em termos nacionais. Esse dinheiro daria para construir uma usina hidrelétrica de 12 MW, não muito mais do que isso, o que representa 0,15% da capacidade nacional instalada. Só para citar outro exemplo, causou pouquíssima comoção na mídia, comparativamente ao caso de Pontes, que o Brasil deixou de receber uma doação de US$ 48 milhões do governo norte-americano, para prevenção da transmissão do HIV, por ter se recusado a declarar que a "prostituição é degradante". Uma exigência sem dúvida descabida e absurda, que só poderia partir de um país governado por George W. Bush, mas o que estarão pensando agora os soropositivos brasileiros sobre essa fantástica decisão burocrática? Por US$ 48 milhões destinados à saúde eu declaro até que a engenharia é degradante!
É claro que a missão teve seu lado patético, para profunda decepção deste autor que cresceu durante o Projeto Apollo. É claro que seria muitíssimo melhor se a missão fosse nossa, se o foguete fosse nosso, se o Programa Espacial Brasileiro não fosse, até o momento, um mero programa de carona patrocinado pelo Estado. Mas querer mais do que isso seria um delírio megalomaníaco. Somos um país pobre, semi-analfabeto, desnutrido e mal-educado. Podemos sonhar com o espaço, mas querer estar lá por força e vontade próprias exigiria o dispêndio de vários bilhões de dólares, dinheiro que o governo nunca colocaria à disposição de um programa desses.
Apesar de tudo, mesmo pegando carona, agora constamos da curta lista de 35 países que enviaram astronautas ao espaço. Chegamos atrás do Vietnã (1980), da Mongólia (1981), do México (1985) e até mesmo do Afeganistão (1988), mas pelo menos chegamos na frente dos hermanos, e é isso que importa!